A IMPRENSA DE CUYABÁ

Domingo, 10 de Dezembro de 2023, 15h:01

Justiça limita em 30% a cobrança da Unimed em terapias de pacientes autistas

Redação | Estadão Mato Grosso

maos de autista

 

A Defensoria Pública de Mato Grosso (DPMT) conseguiu na Justiça que a Confederação Nacional das Cooperativas Médicas (Unimed) se limite a cobrar até o percentual de 30% de coparticipação dos clientes de Campo Verde (134 km de Cuiabá) em tratamentos e terapias contínuas para melhorar capacidades cognitivas e comportamentais. 

A decisão atende à ação civil pública movida pela defensora que atua naquela comarca, Tânia Vizeu, em favor de mais de 100 famílias que integram a Associação de Deficientes de Campo Verde (AME). Mas, o pedido abrange todas as famílias do município que vivem o mesmo problema. 

A AME procurou a Defensoria Pública reclamando da abusividade das cobranças e informando que muitas famílias estariam endividadas e contando com auxílio de parentes para conseguir custear o plano ou até mesmo desistindo do tratamento. Na ação, a defensora pediu que a cobrança de coparticipação para as terapias e tratamentos com autistas fossem suspensas totalmente, com base na Resolução 469/2021 da Agência Nacional de Saúde (ANS), que define tais tratamentos como sendo de prestação continuada e sem limite de sessões, e no Código de Defesa do Consumidor. 

Na decisão liminar, a juíza da 2ª Vara Cível de Campo Verde, Maria Lúcia Prati, atendeu parcialmente ao pedido. 

As mães estão bem contentes e acreditamos que já é o início de uma vitória, reduzir 100% da cobrança para 30%, mas vou analisar se vamos recorrer. Pois, se houver uma onerosidade excessiva, mesmo com essa decisão vamos recorrer. O que posso dizer, por hora, é que foi um avanço muito grande, uma atuação muito profícua da Defensoria Pública na defesa dos portadores de autismo de todo o município”, declarou a defensora.

Ao todo, 15 famílias documentaram na Defensoria Pública que desde o ano passado não conseguem ter ou manter o tratamento continuado de seus filhos. A defensora lembra que um dos agravantes é que o tratamento tem faixa etária definida para ter resultado eficaz no desenvolvimento cognitivo das crianças e adolescentes. 

Se as crianças perdem a janela de tempo de melhor fase para receberem estímulos, o desenvolvimento pode até ocorrer depois, mas será prejudicado. E, o mais importante é, se com a Resolução 469 não há mais limitação no número de sessões para o tratamento para pacientes autista, resta evidente que não se pode mais cobrar coparticipação por sessão realizada”, argumenta.

Tânia lembra que a “onerosidade excessiva e ilegal dos contratos” obriga as famílias a desistirem do tratamento prescrito pelo médico ou a se endividarem, quando não encontram alternativas para o pagamento do mínimo necessário. A limitação no tratamento gera piora no comportamento e na vida social das crianças e adolescentes, que sofrem crises nervosas por incapacidade de lidar com emoções, por hipersensibilidade a sons e luz, pela queda na saúde emocional e na qualidade de vida. 

Originalmente Tânia também pediu, por danos morais coletivos, que a prestadora de serviço de saúde pague o valor de R$ 100 mil, que não encerre os contrato com as famílias e que as crianças e adolescentes autistas de Campo Verde que contratam a Unimed recebam tratamento multidisciplinar integral, tais como terapias de Análise do Comportamento Aplicada (ABA) e Ayres, segundo prescrição médica e sem limites na quantidade das sessões. 

Inicialmente, conseguimos redução desse custeio, para todos, em 70%, sendo que o objetivo é a interrupção total dessa cobrança por várias especificidades e vulnerabilidades. Realizei diversas reuniões com as mães, audiências públicas e ainda estamos no caminho. Mas só dar voz e conseguir uma resposta positiva para um caso onde as pessoas não tinham mais fé, é uma vitória muito grande”, concluiu a defensora.

Valor exorbitante - Uma das mães que figura no processo, Ludimila dos Santos, comprova que o valor mensal do plano de saúde de sua filha foi de R$ 207, no mês de outubro de 2023, já a coparticipação chegou a R$ 2.026, após 26 atendimentos terapêuticos, um atendimento de pronto socorro e um de terapia ocupacional.

A defensora pontua que o Código de Defesa do Consumidor, no artigo 47, prevê que as cláusulas contratuais devem ser interpretadas de modo mais favorável ao consumidor. 

A respeito das cláusulas contratuais, importa registrar que, em que pese a possibilidade da cobrança a título de coparticipação aos consumidores dos planos de saúde, referida imposição não pode constranger o consumidor a cobrança excessiva e que inviabilize o tratamento das crianças e adolescentes ou que caracterize financiamento integral”, argumenta.  

TEA - O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) afeta o desenvolvimento neurológico, e é caracterizado por dificuldades de comunicação e interação social e pela presença de comportamentos ou interesses repetitivos ou restritos. Esses sintomas caracterizam o núcleo do transtorno, mas a gravidade de sua apresentação é variável. Os tipos de autismo englobados na ação são os de CID 11, que abrangem nove tipos caracterizados como 6A02 e suas subcategorias.

Os tratamentos multidisciplinares que resultam em respostas nesses pacientes envolvem acompanhamento de fonoaudiólogo, psicóloga, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta e outros, como o uso da técnica de integração sensorial de Ayres, aplicada há mais de 40 anos, com base em estudos de neurociência, biologia, educação, psicologia e terapia ocupacional e que, como a ABA, é prescrita por médicos no tratamento pelos bons resultados.

O TEA é frequentemente associado a outros transtornos psiquiátricos: do deficit de atenção, hiperatividade, depressão e ansiedade. E a outras condições médicas como epilepsia, esquizofrenia e transtornos genéticos, o que amplia as dificuldades motoras dos pacientes e as dificuldades das famílias. “Quando é detectado qualquer atraso, a estimulação precoce é a regra. Retardar a estimulação significa perder o período ótimo de estimular a aquisição de cada habilidade da criança, por isso, a urgência em solucionar a situação dessas famílias”, assegura a defensora.