22 de Outubro de 2024

OPINIÃO Quinta-feira, 09 de Novembro de 2023, 11:14 - A | A

O fio da meada

art ricardo carvalho

 Ricardo Carvalho

Meus filhos tiveram uma infância protegida, graças a Deus. Não faltava lá em casa um fluxo regular de jogos de tabuleiro e de quebra-cabeças.

Mas naturalmente até isso tem um limite e a "caixa dos jogos" foi definida como o limiar: quando não coubessem mais jogos, alguns teriam que sair para entrar outros.

E assim foi, chegou o Natal daquele ano e toda a gente (ou quase toda, porque vovó insistia em dar meias tricotadas) ofereceu jogos e verificou-se, para desânimo das crianças, que mais nada cabia na caixa.

E agora, que vamos fazer? perguntei a Jay. Ele ficou a olhar para mim e disse: "Vamos tirar os quebra-cabeça antigos, que já fizemos...".

Tiramos tudo da caixa, separámos os antigos, e voltámos a arrumar tudo de volta.

Mas por mais que nós tentássemos, os jogos novos ainda não cabiam todos.... E agora? perguntei, o que vamos escolher? Ele pensou, pensou, tirou tudo da caixa novamente e separou o Risco e o Banco Imobiliário.

Agora já cabiam todos os jogos novos e me deu visibilidade para um processo decisório que é fundamental: imagine todos os problemas que você tem. Não vai resolvê-los todos de uma vez só, vai resolver um por um. E quando você resolve o seu problema principal, você tirou-o do caminho, mas acabou dando uma promoção ao número dois, que agora é o seu principal.
De que forma isto é importante?

Em primeiro lugar, você não fica intimidado pela quantidade ou amplitude dos problemas. Afinal só tem um para resolver.

Não se esqueça que, como espécie, estamos no topo da cadeia alimentar, porque somos ótimos a resolver problemas e para além disso, solucionamos também os desafios do aprendizado e da memória, fazendo com que a metodologia da resolução do problema possa ser reaplicada mais tarde e quantas vezes desejarmos.

Ontem, fiz uma mentoria com um empresário, e quando lhe perguntei "o que lhe tira o sono?" ele falou durante uma hora quase sem parar. Claro que as coisas estavam relacionadas, se interligavam, mas aquilo que ele nos falou foi que estava embrulhado com aquele novelo.

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Na verdade, a expressão que ele usou foi “que não estava conseguindo desembrulhar o novelo", reparem na expressão.

Ao ver aquele novelo, ficou intimidado e entrou em uma paralisia analítica, que lhe impede de decidir por onde começar.

É muito interessante. Ele sabe que ali, naquele novelo, existem, no mínimo duas pontas.

Em segundo lugar, porque focando a sua atenção e esforço na resolução do seu problema principal, ele é mais rapidamente resolvido.
Nós só falamos "o que lhe tira o sono, à noite?"

Mas ao fazer isso, nós pegamos no empresário, tiramos ele do centro do novelo e o colocamos de fora, onde ele mais facilmente vai encontrar as pontas que necessita.

E na minha experiência, esse é o posicionamento comum a uma fatia gigantesca dos nossos empresários e empreendedores: eles conhecem do negócio, mas não entendem de resolução de problemas. E de repente, aparece um, apenas mais um, que turva completamente a visão e lhes tira a capacidade da perspectiva.

Nós não chegamos e falamos: tem que implementar um CRM (Customer Relationship Management) para conhecer os seus clientes, tem que implementar um BI (Business Intelligence) para identificar tendências, tem que pôr um e-Commerce para desmaterializar suas vendas, tem que pôr um BPM (Business Process Management) para agilizar os seus processos.

Quem está de fora, ouvindo o empresário, imediatamente identifica uma lista enorme de ações que podem ser priorizadas para atender o seu caso particular. Mas ele não vê isso. Ele não só vê o novelo, como apenas o vê da perspectiva de quem está no centro, no olho do furacão.

É por isso que estas mentorias têm tido tanto sucesso.

As perguntas que nós fazemos, servem para encontrar respostas para o empresário, mas essas sempre seriam nossas respostas, não as respostas dele, com os condicionantes emocionais e materiais que só ele conhece e tem dificuldade de comunicar.

Não fomos nós que inventámos isso, essa metodologia. Foi Sócrates.

As respostas que ele nos dá, servem acima de tudo para formular novas perguntas, adaptadas a cada caso, que guiem o empresário aos locais onde nós já sabemos que se encontram as respostas que ele precisa encontrar.

Isto é, não importa onde você deseja chegar, importa o que você aprende no caminho. É como eu sempre falo aos meus clientes, "o resultado de um processo nunca é o resultado, é o processo"
E depois a coisa fica fácil, ou pelo menos, mais fácil, porque toda o mundo sabe desembrulhar um novelo: um nó de cada vez.

Ricardo Carvalho é consultor credenciado do SEBRAE, e sócio fundador e CEO da Sucesso.Global

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