26 de Dezembro de 2024

OPINIÃO Sexta-feira, 21 de Julho de 2023, 17:22 - A | A

A Indústria açucareira no Olhar de “Lenine de Campos Póvoas”

Neila

neila barreto

 Neila Barreto

O pesquisador Lenine de Campos Póvoas, em sua publicação, o Ciclo do Açúcar e a política de Mato Grosso, IHGMT – 2000, nos chama a atenção a cotidianos da vivência industrial, em ambiente rústico, nos informando que a vida nas usinas de açúcar de Mato Grosso – engenhos -, era durante o período da safra mais dura que a das fazendas agropecuárias em geral.

“ Na casa de máquinas servia-se, uma dose de pinga, para dar estímulo ao trabalho. Só depois, servia-se o bom café com pão”, (...) e o almoço, mesa farta, ” testemunhou Póvoas. Para ele, a usina açucareira, em Mato Grosso, contribuiu para o aparecimento de uma elite que exerceu influências na política nacional, do país.

Na introdução do seu livro, Póvoas informa que, desde 1719, o açúcar era o mais importante produto de exportação do Brasil e o país o seu maior fornecedor. Nem Joaquim Augusto da Costa Marques e nem Virgílio Corrêa Filho asseguram o princípio dessa indústria em Cuiabá. No entanto, Póvoas registra que, o cronista José Gonçalves da Fonseca, na sua História da situação de Mato Grosso e Cuiabá, informa que por volta de 1750 já se calculava a existência, no distrito de Cuiabá de 16 engenhocas fabricando aguardente e açúcar, onde eram empregados 3.000 negros de Guiné. A exploração da cana de açúcar se tornou, em pouco tempo, das mais importantes, após o ciclo do ouro.

Em 1914, o dr. Costa Marques assinalava a existência de: “ Seis usinas a vapor, de sistema duplo e tríplice efeito, regularmente montadas, cinco à margem do rio Cuiabá a saber: São Gonçalo, Conceição, Aricá, Flexas e Itaici – e uma à margem do rio Paraguai, a da Ressaca que nos pertence. Em quase todas elas existem, além de aparelhos modernos para o fabrico do açúcar, alambiques contínuos e aperfeiçoados contínuos e aperfeiçoados para a destilação do álcool e da aguardente. A produção média diária de cada uma dessas usinas era de 2.000 a 5.000 quilogramas de açúcar e a média da produção total, por safra em 1.000 toneladas métricas de açúcar, tendo elas capacidade para produzirem até 1.500 toneladas por safra”.

Na década de vinte, as usinas de Cuiabá, para baixo eram em número de nove: São Gonçalo, Conceição, Maravilha, São Miguel, São Sebastião, Aricá, Itaici, Tamandaré e Flexas, informando que São Miguel, São Sebastião e Tamandaré funcionavam apenas como destilarias, não produzindo açúcar, somente álcool e aguardente.

Para Eduardo Póvoas, filho do professor Lenine, em depoimento à jornal local, no ano de 2019, sobre as usinas açucareiras informou assim: (...) “ começamos pela localidade denominada de Porto Urbano localizado num local chamado Tibaia, que hoje não é mais navegável abaixo de Barão de Melgaço. Aqui funcionava uma pequena usina. Existiam 19 usinas até Cuiabá fabricando açúcar, pinga e álcool. As maiores, Itaicy e Conceição, só fabricavam açúcar. A Usina Flechas já fabricava açúcar e pinga, esta com o nome de “Umburana” e “flechas” tipo exportação. As usinas Aricá e Maravilha fabricavam açúcar e pinga. Esta última, com uma boa pinga chamada “Formidável”. A usina Tamandaré fabricava as excelentes pingas Verdinha” e “Tamandaré”. A usina Mimosa em Barão de Melgaço, de propriedade da família Damasceno, fabricava a pinga “Mimosa”. A usina São Sebastião e a usina Santa Maria fabricavam pinga. Desta última, o nome da cachaça era o mesmo da usina. As usinas Manoel Nobre, na Praia Grande, São João e São Gonçalo também fabricavam excelentes pingas. Cachoeirinha, da família do Dr. Silvio Curvo, Cachoeira de pau, São José, Santana, também fabricavam pinga de boa qualidade. Subindo o rio vinham as ruínas da Itaicizinho e da São Miguel, perto do Barranco Alto, já desativadas. Algumas destas usinas fabricavam açúcar, pinga, vinagre e o álcool 42 graus. Usavam este álcool para fazer vários tipos de licor, principalmente, o de pequi. Para alguns “pés fofos” este álcool era essencial no preparo do “desdobrado”, sendo 30 a 40 por cento de água. No bairro do Porto, em Cuiabá, alguns bolicheiros costumavam escutar de alguns clientes um pedido inusitado: “me dá um desdobrado aí! Era ingerido como pinga. Isto mais ou menos na metade da década de 50. Destas dezenove usinas, funcionavam a pleno vapor a Itaicy, Conceição, Flechas, Aricá, Maravilha, Tamandaré, Mimosa, São Sebastião, Santa Maria, Manoel Nobre e São João. As últimas a funcionar foram as Flechas e Aricá.

Máquinas da usina Conceição foram vendidas para usina em Jaciara-MT e o imóvel, hoje, pertence à família do falecido Osvaldo Botelho de Campos que ali mantem uma fazenda de gado. A Itaicy pertence a um grupo paulista. A Usina Maravilha se encontra desativada. Aricá se transformou em fazenda de pecuária. Tamandaré, sua última atividade foi o cultivo do arroz. A Ressaca, em Cáceres, foi vendida em 1980 a Grendene S.A., hoje parque pecuário.

(*) NEILA BARRETO é jornalista, historiadora e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso



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