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 Antonio Horácio da Silva Neto

Nesta semana comecei a reler a obra “Eles, os juízes, vistos por um advogado”, de Piero Calamandrei, jornalista, jurista, político e catedrático italiano. Formado na Universidade de Pisa em 1912 e convidado a lecionar a disciplina Direito Processual Civil na Faculdade de Direito de Florença em 1924, onde permaneceu em atividade de docência até o seu falecimento em 1956. Calamandrei escreveu em 1935 este valioso livro e suas considerações e observações sobre o relacionamento entre juízes e advogados, por vezes tenso e conflituoso, ultrapassam a barreira do tempo estando mais atuais do que nunca.Diz Calamandrei na obra citada que “quem entra no tribunal levando em sua pasta, em vez de boas e honestas razões, secretas ingerências, ocultas solicitações, suspeitas sobre a corruptibilidade dos juízes e esperanças sobre sua parcialidade, não se admite se perceber que se encontra, não no severo templo da justiça, mas numa alucinante barraca de feira”.

Segundo Calamandrei, numa interpretação própria e típica de sua percepção de anos sobre o exercício das duas profissões, os juízes deveriam ser os mais incansáveis defensores da advocacia, afirmando que somente onde os advogados são independentes os juízes são imparciais, somente onde os advogados são respeitados os juízes são honrados e completa dizendo que onde a advocacia é desacreditada, se atinge a dignidade dos magistrados e, por isso, torna-se mais difícil e angustiante a missão de justiça.

No entanto, essa posição de proeminência da advocacia para garantir as virtudes esperadas da judicatura, é contrastada com a advertência sobre a necessidade de se respeitar o primeiro requisito do bom advogado, ou seja, o ter fé nos juízes das diversas instâncias.

Salvo melhor juízo, ele assim o faz para mostrar aos jovens, principiantes e modestos advogados a sensibilidade com o direito e a aplicação da justiça pelos juízes, máxime quando esses causídicos são defrontados com os “príncipes do fórum”, que Calamandrei define como alguns advogados que, por sua fama profissional ou política, ou ainda seu preparo técnico, ganham uma suposta posição de destaque e prevalência no tramitar de um processo.

Calamandrei deseja com essa máxima advertir a todos os causídicos que, mesmo diante dos tais “príncipes do fórum”, independentemente de suposta superioridade, eloquência e preparo do adversário, temidas amizades e gabadas proteções, quando sai a decisão favorável ao novel causídico que, supostamente, estaria em posição de inferioridade e sua tese é acolhida, será esse um dia de festa onde se perceberá que mais vale, modesta e obscuramente, ter razão pelos fatos quando se está na presença do justo juiz.

Portanto, é preciso ao advogado sentir o peso da beca tanto quanto os juízes o de suas togas, caminhando para a demonstração da verdade e somente a verdade bastará para receber o direito. Por isso, não se pode esquecer que o magistrado tem o poder do mago da fábula e em alguns casos judicializados pode ocorrer o que diz o brocardo: “res iudicata facit de albo nigrum et de quadrato rotundum” ou no bom português: “a coisa julgada faz do branco o negro e do quadrado o redondo”. Sim, do branco o negro e do quadrado o redondo.

Por isso que sentença e verdade devem estar sempre unidas como gêmeas siamesas, para isso o advogado e o juiz trabalham no processo para que elas acabem unidas. Se a sentença não se ajustar à verdade, ocorrerá a tragédia que Calamadrei tristemente retrata de se reduzir a verdade à medida da sentença no caso. Evidentemente, isso quer dizer que juiz e advogado conduziram a majestade da lei a se fazer paladina do erro na aplicação de justiça.

Em finalização, mais do que uma relação de amor e ódio, juízes e advogados devem se conscientizar que entre ambos não são necessários tais sentimentos, menos ainda admiração, mas apenas e tão somente o respeito de se sentirem escravos de um mesmo dever, que é a busca de aplicar a lei para seu maior ideal: fazer justiça.

Antonio Horácio da Silva Neto é  Magistrado, iniciou sua carreira jurídica aos 21 anos como promotor de justiça do Ministério Público do Estado de Rondônia. Aos 25 anos ingressou na magistratura no estado de Mato Grosso, onde exerceu os cargos de juiz substituto, juiz de direito, juiz de direito substituto de segundo grau no Tribunal de Justiça, juiz membro do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso e, ainda presidente da Associação Mato-grossense de Magistrados.