22 de Outubro de 2024

OPINIÃO Terça-feira, 24 de Setembro de 2024, 13:08 - A | A

E vamos vivendo de lembranças e de boas recordações do nosso pantanal

francisco campos  ihgmt

 Francisco Ildefonso da Silva Campos

Convivendo com o pantanal desde a infância, em Poconé-MT, hoje muita angústia toma conta do meu ser. Muito sofrimento para o homem pantaneiro sem as chuvas que trazem vida e saúde para o homem e a fauna e flora pantaneira, além da legislação vigente.

Conforme o engenheiro Rubem Mauro Palma de Moura, professor aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT e ex diretor da antiga Sanemat, um estudioso do rio Cuiabá, na década de 70 a população de Cuiabá não passava de 50.000 habitantes, hoje está com quase 1 milhão de pessoas. Olha a descarga de lixo e esgoto sem tratamento que são despejados no Rio Cuiabá, cujo destino direto são as baias do pantanal. Pasmem! O saneamento urge em nossa capital.

A fartura de peixes que existia em outros tempos está na pesca descontrolada e, também, pela má qualidade da água que afeta toda cadeia reprodutiva dos peixes, bem como, a falta de água na subida dos cardumes pelo rio.

Porém, existe um fato positivo que é a represa de manso que controla o volume de água no Rio Cuiabá. Antes da represa passava somente 44 metros cúbicos de água por segundo. Esta era a vazão e hoje com a represa passam 99 metros cúbicos de água por segundo. Praticamente dobrou o volume de água e graças a essa represa Cuiabá tem água pronta para ser captada para todos habitantes. Não houve ampliação do sistema de abastecimento para atender essa demanda.

Eu presenciei diversas pessoas atravessando a pé o Rio Cuiabá perto da ponte, no bairro do Porto, na capital, no ano de 1972, época da maior seca. Eu concordo com o engenheiro quando diz que, hoje essa alteração climática e cíclica embora com maiores ondas de calor é devido aos desmatamentos para plantio de grandes áreas de soja tanto no centro oeste como em Tocantins, Bahia e Maranhão.

Estamos em uma estufa de alta incidência de raios solares em áreas sem vegetação e transformado em uma panela de pressão. E nesse ambiente de altas temperaturas as nuvens não conseguem furar essa frigideira. Lembro bem na década de 70 no pantanal, os rios Casange e Pixaim, em Poconé-MT, que atualmente estão secos e assoreados, no ano de 1972, ano da maior seca, lá na fazenda Sarare levávamos o gado para beber água em um grande estirão de água no Rio Casange, hoje não existe uma gota d’água. Está completamente aterrado pelos sedimentos do Planalto da agricultura e do lixo das grandes cidades.

O pantanal está seco e perdeu toda água, acabaram os grandes corixos e lagoas. As baias secaram e viraram cemitério de animais atolados em busca das últimas gotas de água. Esta é a realidade do pantanal e do homem pantaneiro. Vivemos seca drástica e dolorida.

Dias desse, uma pessoa me respondeu: mas todo Brasil está com os rios secos, mas aqui no pantanal é pior está agonizando aos poucos com sedimentos de areia e rejeitos de garimpo que desce para nossa planície pantaneira. Verdade. Sofrem o homem e o meio ambiente. Matam a fauna e os animais.

Hoje os olhos das pessoas sabem que estão vendo tudo acabar como as belas paisagens dos campos e os pantaneiros, mas, por uma visão econômica, as vezes dentro das famílias, fecham os olhos para toda essa destruição ambiental.

Os grandes incêndios dentro do Pantanal são causados pela grande quantidade de plantas invasoras como pombeiro, cambará etc., que tem as raízes bem profundas e conseguem buscar água no subsolo, o que não ocorre com as gramíneas rasteiras.

Essa falta de manejo dos campos pantaneiros está possibilitando a formação de grandes extensões de campos sujos, e com essa massa vegetal nesses campos torna-se um barril de pólvora e de difícil controle desses incêndios.

O Pantaneiro está sem meios de fazer a limpeza dos campos, porque também a legislação ambiental não permite. A substituição de gramíneas mais produtivas será de bom alvitre para os pantaneiros, e com isso vamos ainda conseguir nos mantermos em atividade dentro desse bioma, onde estamos há mais de 300 anos.

Na última seca de 2020 eu sugeri que fizessem diversos tanques escavados ao longo dá transpantaneira, onde os animais poderiam beber água e também auxiliar os bombeiros em caso de fogo. Fizeram uns poços artesianos me parece que foram três e estão com problemas de energia e bombas de captação e local para armazenar essa água. É triste ver tudo que estamos passando com essa falta de água e alimentação para os animais.

Hoje recebi a triste notícia que um conhecido meu vendeu sua propriedade, o pouco que ainda tinha de gado não estava conseguindo manter sua família.

E vamos vivendo de lembranças e de boas recordações do nosso pantanal.!!!!

   Francisco Ildefonso da Silva Campos é Agrônomo, membro do IHGMT e membro da Acadepan.



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Lourival Alves Soares 25/09/2024

Parabéns pelo artigo sobre o nosso querido Rio Cuiabá, Francisco Campos. Esse seu artigo calha a realidade nua e crua do rio Cuiabá, bem como, do sofrimento que vem passando o homem pantaneiro. Esse é o reflexo da irresponsabilidade dos nossos governantes que não coibem os desmatamentos das cabeceiras das nascentes dos nossos córregos e rios e suas matas calibres. Na contra mão de tudo isso, o atual governador de Mato Grosso quer autorizar construções de PCHs no Rio Cuiabá, bem como autorizar o uso das áreas das reservas ambientais existentes em nosso Estado.

catia 25/09/2024

Ola Francisco, Parabéns pelo texto em boa hora. Concordo plenamente com a sua observação sobre o estado alarmante dos corpos de água, que estão cada vez mais assoreados. Essa questão, aliás, foi algo que abordei já em 2020, em um artigo publicado na revista Ecco, onde destaquei a necessidade urgente de manter a água na paisagem. Infelizmente, pouco foi feito desde então, e agora estamos lidando com as consequências de uma gestão inadequada dos recursos hídricos. O tempo para agir está se esgotando, e precisamos adotar uma abordagem séria e comprometida para amenizar esse cenário. Além disso, o fogo, que historicamente segue os períodos de seca, tem sido cada vez mais devastador. A combinação de mudanças climáticas e o uso inadequado da terra está exacerbando essa relação, deixando claro que não podemos mais ignorar a necessidade de adaptações. Quer gostemos ou não, as mudanças climáticas são uma realidade e demandam alternativas concretas e baseadas na ciência para minimizar seus impactos. Este é o momento de refletir sobre o que foi feito e, mais importante, sobre o que ainda precisa ser feito. Precisamos urgentemente de mudanças de paradigmas, embasadas em ciência e gestão sustentável, para restaurar e proteger a água na paisagem. A conservação das áreas úmidas, especialmente no Pantanal, deve ser uma prioridade inegociável. Como especialista em ecossistemas de áreas úmidas, é nossa responsabilidade assegurar que o conhecimento científico se traduza em ações concretas, buscando soluções adaptativas e inovadoras que garantam a resiliência da paisagem frente aos desafios climáticos que já se fazem sentir.

cleber 25/09/2024

as pessoas cultas de nossa sociedade que trabalham, opinam e influenciam(acham que tem a receita perfeita, se enganam, não conhecem) as atividades que o nosso governo aplica, para obrigar os pantaneiros a viverem conforme seus pseudos conhecimentos sobre o pantanal, diferem totalmente das reais necessidades que o pantanal precisa para se manter equilibrado, acho que temos pessoas capacitadas para manter esse equilibrio, bastando para isso utilizar de bom senso e implementarmos algumas atividades que no passado eram suficientes para melhorar a vida das pessoas, fauna e flora da região e manter nosso querido pantanal em sua melhor forma.

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